A reunião aguardada do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central está próxima e prevê-se um aumento de, ao menos, 0,50 ponto percentual (p.p.) na Selic.
Todavia, Rafaela Vitoria, principal economista do Banco Inter, declarou ao Money Times que não há urgência em elevar as taxas neste momento.
A ata da última reunião do Comitê e comunicações recentes indicam o desejo do Copom de manter seu guidance e recuperar a credibilidade.


“Acredito que os primeiros sinais de desaceleração, especialmente no contexto global da guerra tarifária, e os aspectos considerados nesta reunião pelo Copom são relevantes. Mesmo não sendo uma má notícia para o Brasil, devido ao crescimento econômico acima do potencial, essa desaceleração contribui positivamente para o processo de desinflação, apesar da incerteza atual a longo prazo”, ressalta.
Com a Selic em 14,25%: aumento de 0,25 p.p. ou de 0,50 p.p.?
Além do conteúdo da ata anterior, a credibilidade que o Copom busca restabelecer é evidente. Segundo a economista, a falta de credibilidade reflete nas expectativas de longo prazo, que permanecem instáveis.
Nesse contexto, o Inter prevê que o Copom opte por uma decisão um pouco mais incisiva no momento e mantenha um processo de elevação.
“Temos até um cenário alternativo, no qual o aumento pode ser de 25 pontos e não de 50“, comenta. “Acredito que essa possibilidade pode ser considerada no Copom. Não vejo divisão de votos, mas essa discussão entre 25 e 50 pode ocorrer, diante das expectativas de desaceleração da atividade, especialmente no contexto global”, completa.
Dessa forma, Vitoria estima que na próxima reunião do Copom, a Selic seja elevada em 0,50 p.p. ou, em uma alternativa, em 0,25 p.p., sinalizando o término do ciclo em ambas as possibilidades.
Confira a entrevista completa abaixo:
Money Times: “Qual a previsão para este Copom?”
Rafaela Vitoria: “Nossa projeção é de um aumento de 0,50 pontos para a próxima reunião. Na realidade, acreditamos que não seria necessário um aumento. Portanto, pensamos que o Copom deveria manter a taxa inalterada.
No entanto, a mensagem da última ata e comunicações recentes indicam a intenção do Copom de manter seu guidance.
Além disso, há um problema de credibilidade que o Copom está tentando resolver, e essa falta de credibilidade é visível nas expectativas, inclusive nas de longo prazo e de inflação, que ainda estão instáveis. Neste sentido, entendemos que o Copom tende a agir de forma um pouco mais firme neste momento e manter a tendência de alta.
Nós até consideramos um cenário alternativo, no qual esse aumento pode ser de 25 pontos e não de 50. Acho que essa discussão pode ocorrer no Copom. Não vejo dissidência nos votos, mas pode haver uma discussão entre 25 e 50, diante da expectativa de desaceleração da atividade, especialmente em nível global.
No cenário externo, estamos vendo a queda do petróleo e a Petrobras (PETR4) reduzindo os empréstimos para baixar os preços da gasolina.
Assim, existem alguns impactos adicionais na inflação que podem surgir nesse cenário, o que poderia levar o Copom a decidir por um aumento um pouco menor.
No entanto, atualmente, prevemos um aumento de 0,50 p.p. e um cenário alternativo de 0,25 p.p.. Em ambos os casos, consideramos que este será o encerramento do ciclo.”
Money Times: “Qual é o limite máximo para o BC elevar a Selic?”
Rafaela Vitoria: “Para o Inter, nossa projeção é de 14,75% como a Selic final.”
Money Times: “Quais são as estimativas para a inflação e o dólar?”
Rafaela Vitoria: “Atualmente, esperamos que o dólar fique em uma média anual de R$ 5,80 e um IPCA de 5,4% em 2025, com uma tendência de baixa e uma possível desaceleração maior, especialmente nos bens comercializáveis, industriais e até mesmo nos alimentos e combustíveis, devido à cotação internacional das commodities.
Aguardamos para ver como o cenário internacional se desenvolverá, mas as tendências atuais indicam uma desaceleração adicional em relação ao nosso cenário base.”
Money Times: “Com a tarifa de 10% imposta por Trump, o que se pode esperar e quais pontos devem ser observados pelos investidores neste momento? Qual é a estimativa do impacto da ‘guerra comercial’ neste próximo Copom?”
Rafaela Vitoria: “Vejo dois pontos importantes. Primeiramente, já temos tarifas adicionais em vigor e tarifas que foram suspensas para negociações. Portanto, é altamente provável que as tarifas possam atingir 10% ou mais.
Nossa expectativa é que, inicialmente, haja uma desaceleração da atividade global, tanto nos Estados Unidos quanto na China, afetando todos os países envolvidos na cadeia global de produção de bens industriais.
Observamos o reflexo inicial dessas reduções nas expectativas de crescimento nos preços das commodities, especialmente nos setores de energia. Se a produção industrial diminui, a demanda por energia diminui, assim como a demanda por combustível se a logística é afetada, refletindo-se já no preço do petróleo devido às expectativas de uma atividade mais fraca. Neste momento inicial, a principal consequência é a desaceleração da economia global.”
Money Times: “Scott Bessent, secretário do Tesouro dos Estados Unidos, indicou anteriormente um possível grande realinhamento econômico global; como você vê essa possibilidade para os investidores?”
Rafaela Vitoria: “Atualmente, estamos diante de um cenário de grande incerteza, tornando difícil prever como será o realinhamento do comércio global, pois as tarifas foram anunciadas de forma surpreendente pelo mercado, tanto em sua abrangência quanto em sua magnitude, com tarifas por país e não por produto — uma definição de tarifas um tanto peculiar.
Esperávamos um aumento nas tarifas, mas não da forma como foi anunciado, nem em sua amplitude. Existe desequilíbrio na economia dos EUA, com um grande déficit fiscal e de conta-corrente, perda de competitividade na produção industrial, concentração de dependência e aumento da necessidade de importações da China.
Essa discussão já vem ocorrendo desde a pandemia. A crise gerada pela pandemia alertou sobre a dependência dos EUA de importações e de produtos chineses. Há a necessidade de diversificar essas relações e acredito que caminhamos para isso, visando uma redução da dependência entre EUA e China. Contudo, será um processo gradual, sendo ainda cedo para fazer afirmações concretas.
No entanto, acredito que os primeiros sinais de desaceleração, apesar de não serem negativos para o Brasil, devido ao crescimento econômico acima do potencial, contribuem positivamente para o processo de desinflação, apesar da incerteza no horizonte de longo prazo.”
Money Times: “Levando em conta o cenário atual de mercado, qual seria a sua recomendação geral para os investidores neste momento?”
Rafaela Vitoria: “Ainda há muita incerteza no horizonte mais amplo, porém, os retornos dos títulos de renda fixa no Brasil permanecem atraentes.
Mesmo com o Copom encerrando o ciclo um pouco antes do esperado — vale lembrar que a Curva Futura chegou a precificar em 15,75%, indicando o final do ciclo —, estamos nos encaminhando para um encerramento em 11,75%.
Essa taxa ainda é significativamente elevada, considerando uma inflação em torno de 5% a 5,5% atualmente. Portanto, os retornos da renda fixa no Brasil continuam interessantes, tanto para investimentos de curto prazo, que mantêm uma remuneração atrativa, quanto para investimentos de longo prazo, nos quais os prêmios na curva permanecem elevados. Observamos a redução das taxas prefixadas, porém não das taxas reais.
Considerando o IPCA mais 7%, 7,5%, estaríamos alcançando níveis históricos, refletindo um cenário de crise fiscal aguda, similar ao período de 2014 e 2015.
Portanto, a renda fixa no Brasil permanece atrativa, apesar do Copom encerrar o ciclo um pouco antes do previsto.
Diante da incerteza atual, recomendamos que a renda fixa seja a principal alocação de investimentos no Brasil.”
Fonte: Money Times