O responsável pela Política Econômica do Banco Central, Diogo Guillen, declara que o atual cenário econômico apresenta diversas camadas de incerteza, mas que as projeções do mercado são muito importantes no esquema de metas para a inflação.
No decorrer da cerimônia de premiação dos Top 5 do relatório Focus de 2024, ocorrido nesta segunda-feira (7), na sede da autoridade monetária em São Paulo, Guillen mencionou que a desvinculação das previsões de inflação é um motivo de preocupação para todos os membros do Comitê de Política Monetária (Copom) — e essa questão foi ressaltada nas recentes atas exatamente para destacar o tema.
“Quando mencionamos ‘todos’, creio que foi um acentuar adicional enfatizando novamente esse papel da desvinculação das previsões no regime de metas, e realçando esse cenário mais desafiador quando se tem previsões desvinculadas, exigindo uma restrição monetária mais intensa, como estamos observando atualmente, e por um período mais longo do que seria apropriado se não houvesse essas previsões desvinculadas”, afirma.




Apesar de ser um período de maior cautela, o responsável reitera que as projeções do mercado são “muito relevantes” no sistema de metas, evidenciando a importância do próprio relatório Focus no mercado.
“Recebemos muitas solicitações de outros bancos centrais para tentar desenvolver sistemas tão eficazes quanto o Focus, incluindo países desenvolvidos”, mencionou.
Para ele, o sucesso do Focus abarca aspectos cruciais como a prontidão das coletas, as datas críticas, a publicação semanal e a ampla gama de projeções solicitadas, além do próprio Top 5, que reconhece as instituições com maior acerto nas porcentagens e dados. “O Focus representa um farol nesta elaboração de previsões”, mencionou.
O leque de variáveis é consideravelmente mais abrangente do que o usual em uma pesquisa de previsões, explica. “Claro, a projeção de inflação é o nosso foco e é o que vamos sempre analisar com maior atenção, mas o fato de contemplar atividade, fiscal, externo, juros, permite ter uma visão geral sobre toda a economia, o que também considero bastante produtivo”.
Guillen ainda completou que o cenário está “extremamente incerto”, principalmente devido à situação internacional, incluindo o nível das tarifas dos Estados Unidos e a resposta que será adotada pelo Federal Reserve.
Cenário global, inflação e os efeitos do ‘tarifaço’ de Trump
Ainda durante a cerimônia, os economistas que participam das projeções econômicas do Boletim Focus, do Banco Central, enfatizaram uma atual incerteza sobre os efeitos do “tarifaço” anunciado pelo presidente dos Estados Unidos (EUA), Donald Trump.
Em um debate sobre o cenário global, Fernando de Paula Rocha, associado da gestora JGP, realçou que diante do panorama no exterior, há uma abertura para uma possível elevação na taxa de juros, devido ao deslocamento das duas curvas — o que resultaria em um câmbio mais valorizado.
“Para os países emergentes, acredito que teríamos uma tendência de desvalorização cambial, um impacto adverso no choque de oferta, o que tenderia a depreciar as moedas”, afirmou.
No entanto, os países produtores — especialmente os asiáticos — terão que reduzir as exportações para os EUA, levando à possibilidade de tentar comercializar seus produtos para países emergentes, com um possível impacto desinflacionário, embora uma possível desvalorização cambial possa mitigar os efeitos.
Na visão do economista, nesse contexto, dúvidas sobre o fluxo de investimentos para os EUA também são esperadas.
O economista Eduardo Vecchio, da Caixa Asset, ressaltou que as tarifas mínimas, de 10%, aparentam ter chegado para ficar. Isso ocorre porque, a certeza atual é de um mundo mais inflacionário, pelo menos a curto prazo, pressionado pela incerteza sobre a velocidade da desaceleração da economia americana e mundial, bem como a postura do Federal Reserve e a precificação do corte de juros no mercado.
Já Carlos Thadeu Freitas Gomes Filho, economista-sênior da BGC Liquidez, considerou uma depreciação cambial, o que deve dificultar a melhoria das projeções de inflação. Isso em um momento em que o governo precisará intervir para evitar uma desaceleração da atividade.
O economista enfatiza que, com o IPCA já pressionado, a inflação de serviços continuará influenciando a variação de preços nos próximos dois ou três trimestres.
Por fim, o economista-chefe do C6 Bank, Felipe Salles, indica que a interpretação em relação às tarifas é de ‘choque negativo de oferta’, ou seja, um cenário em que a inflação americana aumenta e o Produto Interno Bruto (PIB) é reduzido. Para Salles, caso os EUA se tornem uma economia ‘fragilizada’, a tendência é que haja deflação visando a um incremento na aversão ao risco, resultando na desvalorização das moedas de países emergentes.
“Nesse sentido, existem duas possibilidades pelo Fed: se as expectativas não se desvincularem, por alguma razão, o cenário básico do mercado se materializar, o Fed conseguirá combater a recessão reduzindo os juros”, comenta. “Por outro lado, se as expectativas de inflação de fato se desvincularem, o Fed ficaria sem recursos, ou seja, não teria capacidade para combater a recessão. Este segundo cenário seria mais desafiador, tanto para as economias desenvolvidas como para as emergentes”, conclui.
Fonte: Money Times