A Argentina procura uma nova assistência do Fundo Monetário Internacional (FMI) – no montante de US$ 20 bilhões – para, de acordo com o governo de Javier Milei, fortalecer as reservas do Banco Central (BC) do país. Para críticos, a medida visa evitar o aumento da inflação devido à escassez de dólares. Durante sua trajetória, a Argentina já obteve 23 auxílios do FMI.
“O valor negociado com a equipe técnica do FMI, que ainda deve ser aprovado pelo conselho do Fundo, é de US$ 20 bilhões. Esse número é substancialmente maior do que as especulações que circulam por aí”, declarou o ministro da Economia, Luis Caputo, nesta quinta-feira (27), em um evento do setor de seguros latino-americanos.




Ainda não há detalhes sobre as condições exigidas pelo FMI para o novo auxílio. O responsável pela política econômica do governo argentino também mencionou estar em negociações para obter empréstimos “sem restrições” do Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CAF).
O anúncio do ministro surge logo após ele se recusar a revelar informações sobre as negociações com o FMI. O diretor do Observatório da Dívida Pública Argentina, o historiador Alejandro Olmos Gaona, afirmou que Caputo tentou acalmar o mercado financeiro diante da pressão cambial recente, que teria sido provocada por rumores sobre o acordo com o Fundo.
“Em um mês, foi desembolsado US$ 1,4 bilhão para estabilizar o mercado cambial, porém o dólar continua em alta. A declaração do ministro, como ele mesmo explicou, busca conter a disparada do câmbio e acalmar os mercados”, disse o diretor à Agência Brasil.
Segundo Alejandro Olmos Gaona, o empréstimo é motivado pela necessidade do governo de manter uma taxa de câmbio artificialmente baixa por meio da venda de dólares no mercado.
“O governo está urgente por dólares para fortalecer o Banco Central e manter o controle inflacionário [por meio da inserção de dólares na economia], pois isso tem sido crucial para o apoio à presidência de Milei. Contudo, não se sabe a quantia exata que será disponibilizada, as condições que serão impostas e como o dinheiro será utilizado posteriormente”, comentou o especialista.
Em decorrência da recessão enfrentada pelo país, a inflação na Argentina caiu de 287% ao ano, em março de 2024, para 66% ao ano, em fevereiro de 2025, de acordo com os dados oficiais.
O diretor do Observatório da Dívida Argentina destacou a constante diminuição das reservas do BC. “Essa situação não permite ao governo manter a ficção de uma taxa de câmbio estável”, afirmou.
A imprensa argentina relatou que uma das exigências possíveis do FMI é a redução ou eliminação dos controles cambiais presentes no país, como a restrição de compra de até US$ 200 por mês por pessoa. A perspectiva de implementar uma política cambial totalmente livre tem impulsionado a busca por dólares.
Reforço do Banco Central
O objetivo do governo de Javier Milei é concretizar o acordo até meados de abril. Caso confirmado, será o terceiro empréstimo com o Fundo desde que o governo de Maurício Macri estabeleceu um acordo em 2018, para a obtenção de US$ 56 bilhões.
O governo de Milei argumenta que pretende “limpar” as reservas do Banco Central (BC), atualmente lastreadas em títulos do Tesouro, substituindo esses títulos por dólares. Com essa alteração, em vez de dever ao BC, o governo argentino passaria a dever ao FMI, enquanto o BC contaria com reservas em dólares, e não em títulos do Tesouro.
De acordo com o ministro da Economia, Luis Caputo, essa operação proporcionaria uma maior estabilidade à moeda local, o peso argentino, fortalecendo o controle inflacionário sem aumentar o montante total da dívida do país.
“O montante não se destina a financiar despesas nem déficits, mas sim a recapitalizar os ativos do Banco Central. Nosso objetivo com esse acordo é garantir que, finalmente, os pesos tenham lastro no BC”, afirmou o ministro da Economia.
Com o auxílio financeiro, Caputo espera elevar as reservas do BC argentino para US$ 50 bilhões. Atualmente, o banco detém reservas avaliadas em US$ 26 bilhões. Para efeito comparativo, o Banco Central do Brasil encerrou 2024 com reservas na ordem deUS$ 329,7 bilhões.
Endividamento Público
O diretor do Observatório da Dívida Pública da Argentina, o historiador Alejandro Olmos, questiona a afirmação de Caputo de que o novo empréstimo não traz riscos por não aumentar nominalmente a dívida do governo.
“Endividar-se com o BC, que faz parte das estruturas do Estado e não impõe exigências nem requer ajustes, é bem diferente de contrair dívida com o FMI, que estabelece condições rigorosas, demanda determinadas regulações econômicas e monitora a economia do país”, ponderou.
Olmos salientou que a dívida argentina atualmente é de cerca de US$ 471 bilhões, resultando em pagamentos anuais de juros estimados em cerca de US$ 22 bilhões. Em contraste com a Argentina, o Brasil possui a maior parte de sua dívida pública denominada em reais, facilitando o pagamento e a renegociação dos passivos.
Segundo o especialista Alejandro Olmos, o novo empréstimo não é viável, e ele defende uma estratégia para solucionar a questão da dívida pública.
“O dilema reside no fato de que o poder econômico, os economistas e os teóricos persistem em afirmar que a única maneira viável de promover o desenvolvimento de um país é por meio da contração de empréstimos. A história da Argentina, contudo, tem mostrado que todos os acordos com o FMI acabaram em fracasso”, expôs o historiador.
Por outro lado, há a expectativa de que a exploração dos recursos de petróleo e gás na região de Vaca Muerta gere receitas e dólares, o que pode possibilitar que a Argentina continue arcando com suas dívidas.
“O problema é que as políticas adotadas são conjunturais; não há um planejamento estatal para um desenvolvimento sustentável”, concluiu Olmos.
Fonte: Agência Brasil