O Brasil necessita demonstrar ponderação e prudência na réplica aos Estados Unidos, após os EUA aumentarem a tarifa de importação dos produtos brasileiros para 50%, declarou Tony Volpon, o ex-diretor do Banco Central, ao Money Times.
Na noite de quarta-feira passada, o líder Donald Trump cumpriu sua promessa e elevou as taxas para 50%, tornando o Brasil o país mais taxado até o momento.
No comunicado enviado ao presidente Lula, Trump alegou que os EUA estão sofrendo na relação comercial com o Brasil.




No entanto, em 2024, os Estados Unidos registraram um superávit de US$ 7,4 bilhões nas trocas comerciais com o país.
Trump também mencionou o processo envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro, afirmando que ele está sendo “alvo de perseguição” pelo sistema judiciário brasileiro.
“O cemitério é cheio de heróis. Precisamos ser cautelosos, reconhecendo com quem estamos lidando. Trump poderia, em teoria, elevar isso para 100% — o que não afetaria muito a economia americana, mas teria um grande impacto sobre o Brasil”, afirmou Volpon.
Para ele, é fundamental que o Brasil dialogue e evite embates de cunho “nacionalista”.
“O Brasil deveria tentar envolver os Estados Unidos no aspecto comercial e tentar contornar as questões político-jurídicas, por assim dizer. Este é um caminho que talvez obtenha algum êxito”.

Governo até o momento
Segundo Volpon, Lula teve uma reação comedida.
Em publicação no X (antigo Twitter), o presidente afirmou que o Brasil é um país independente, com instituições autônomas, e que não tolerará intervenções externas.
“Poderia ter sido bem pior. Ele não expressou descontentamento com o Trump, não entrou em conflito. Claramente, foi uma atitude calculada. Isso é positivo. Não partimos para a confrontação direta, porque, mais uma vez, é uma disputa que sairíamos derrotados”.
O ex-diretor do Banco Central recorda o que ocorreu com a China: Trump impôs tarifas, o país asiático retaliou, e ele aumentou ainda mais.
“Chegou a um ponto em que o comércio quase foi interrompido. O mercado reagiu negativamente, então ele recuou”.
No entanto, o Brasil pode ter um desfecho diferente, pois não possui a importância da potência asiática. Nesta quarta-feira, por exemplo, as bolsas americanas operam de forma estável.
“Portanto, não se trata de queda do S&P 500 e ele recuar. Isso não vai ocorrer. Por isso, é arriscado entrar nesse jogo de ataque e contra-ataque, pois, diferentemente do caso chinês, não há um amortecedor para conter reações exageradas, como o mercado acionário americano”.
A seguir, os principais trechos da entrevista:
Money Times: Quais serão as repercussões para o Brasil dessas tarifas de 50%?
Tony Volpon: Ao ouvir a notícia ontem, pensei: bem, se ficar por aí, o impacto será limitado, pois os Estados Unidos não são nosso principal parceiro comercial, e parte significativa de nossa produção exportada para eles pode ser redirecionada para outros países.
Nossa principal exportação são commodities com baixo valor agregado.
Se não puder vender petróleo para os Estados Unidos, posso vendê-lo para a Europa ou China. Portanto, existe um efeito de substituição que ameniza o impacto do choque.
O que não será atenuado a curto prazo, visto que pode levar um tempo para realizar esse processo de substituição, pode ser aliviado pelo câmbio. Uma determinada desvalorização cambial é responsável por isso.
Dado que nossas exportações representam 2% do PIB, o que não é insignificante, porém, se permanecer nesse patamar, não chegará a zero, e com o efeito de substituição e um ajuste cambial, a economia se adaptará sem grandes turbulências.
Acredito que a movimentação cambial hoje está em certo ponto, sugerindo que este é verdadeiramente o veredicto do mercado neste momento — que isso não desencadeará uma grande crise para a economia brasileira.
Vale lembrar também que a economia brasileira é uma economia fechada.
Não exportamos tanto.
A situação difere da China, por exemplo, que exporta em grande quantidade.
Somos uma economia predominantemente de serviços, e nenhum desses setores será afetado por essa medida de Trump. Portanto, creio que não é uma boa notícia, mas também não é algo existencialmente preocupante.
Money Times: Como o Brasil deve reagir a isso? Alguns mencionam retaliação.
Tony Volpon: Acredito que devemos separar a questão política da questão comercial.
O aspecto político é simplesmente isso: se a Justiça deseja julgar Bolsonaro, assim o fará. E se Trump pretende reagir, igualmente o fará.
São duas nações soberanas agindo dentro de seus direitos.
Não há uma força que determine que os Estados Unidos não possam encerrar a compra de nossos produtos se considerarem que há um posicionamento antiamericano.
Me preocupa que o governo esteja encontrando êxito nesse discurso de “nós contra eles” e esteja internacionalizando isso, agora elegendo Trump e os EUA como oponentes.
Se seguirmos por esse caminho, poderemos enfrentar mais medidas. O comportamento favorável do mercado atualmente não se repetiria.
Seria muito pior.

Money Times: Você acredita que esse aumento das tarifas poderá de alguma forma afetar as taxas de juros no Brasil?
Fonte: Money Times