Em períodos de tranquilidade, é simples confiar em instituições bancárias, governamentais e unidades monetárias nacionais. As transações acontecem sem obstáculos, as retiradas são autorizadas, o endividamento circula e o sistema econômico parece estável. Todavia, basta um confronto armado ou uma séria crise geopolítica para que essa situação se desfaça em questão de dias, às vezes, em horas. É nesses instantes que os ativos eletrônicos, em especial o bitcoin (BTC), abandonam a condição de teste tecnológico e se convertem em meios concretos de proteção financeira.
Historicamente, confrontos bélicos e declínios econômicos acarretam três resultados diretos: a desvalorização das moedas locais, a implementação de limitações de capital e a deterioração da confiança nas entidades estatais e bancárias. Esses três elementos impactam diretamente o cidadão comum, que subitamente se vê impossibilitado de efetuar saques, enviar recursos para o exterior ou até mesmo preservar o valor do que economizou ao longo dos anos.
A hiperinflação já evidenciou sua face em várias ocasiões históricas, de maneira severa. Alemanha na década de 1920, Zimbábue nos anos 2000 e, mais recentemente, Venezuela e Argentina. Em todas essas situações, as moedas nacionais perderam praticamente toda sua capacidade de aquisição. Ninguém deseja carregar milhões de unidades de uma moeda que sequer equivale ao valor de um pão. E quando um conflito irrompe, a instabilidade é ainda maior: bancos transferem recursos para outras regiões geográficas, sistemas ficam inoperantes, a obtenção de crédito e o real valor dos ativos se tornam incógnitas. Não é exagero afirmar que, em cenários de conflito, o dinheiro tradicional simplesmente desaparece.



É nesse vácuo que os ativos eletrônicos ganham importância. O Bitcoin, por exemplo, não está sujeito a um banco central, não requer um banco para ser movimentado e não pode ser confiscado por determinação legal. Uma pessoa consegue atravessar fronteiras apenas com uma palavra-passe memorizada — sua seed phrase, ou frase-semente — e, assim que chega ao destino, recupera todo o seu patrimônio digital em poucos minutos. Essa capacidade de preservar e transportar valor sem depender de nenhuma entidade é o que torna o Bitcoin uma ferramenta tão eficaz em tempos de urgentes necessidades financeiras.
O que anteriormente parecia um pormenor técnico, como a descentralização da rede Bitcoin, hoje se mostra uma solução prática para quem enfrenta perigos reais. Em áreas sob domínio militar ou com governos autoritários, as pessoas não têm tempo para aguardar decisões judiciais ou depositar confiança em promessas governamentais. Elas necessitam salvaguardar seu capital imediatamente. E isso não é uma abstração: exemplos concretos ilustram como os ativos eletrônicos se converteram em refúgio e via de escape.
Conflito na Ucrânia, o caso recente
Na Ucrânia, depois da invasão russa de 2022, inúmeras pessoas recorreram a ativos criptográficos como forma de preservar sua liquidez e resguardar seu patrimônio. Contribuições internacionais feitas em Bitcoin e Ethereum alcançaram diretamente soldados, organizações não governamentais e famílias deslocadas.
Na Venezuela, a total desvalorização do bolívar obrigou milhões a adotarem o dólar informal ou ativos eletrônicos como Dash e Bitcoin, mesmo diante de bloqueios e perseguições. No Afeganistão, após o retorno do Talibã ao poder, ativistas e mulheres apelaram ao Bitcoin para manter seus recursos longe de um sistema financeiro controlado por extremistas. Esses exemplos não são casos isolados: são indicativos claros de uma tendência global.
Inúmeras pessoas ainda enxergam o Bitcoin como um ativo para especulação ou como uma bolha tecnológica. Contudo, essa perspectiva negligencia sua função mais intrínseca: a de moeda de guerra, reserva de valor e barreira contra a censura. Enquanto o ouro tradicionalmente desempenhou esse papel de proteção física, o Bitcoin representa sua versão digital. Uma reserva de valor que consegue ser transferida por redes globais, a qualquer momento, sem depender de intermediários.
Existe um ditado entre apoiadores dos ativos robustos que ilustra bem essa lógica: “Se ocorrer uma catástrofe, restarão apenas duas moedas: o ouro em seu poder… e o Bitcoin que ninguém pode apreender e estará disponível em qualquer lugar.” E isso não é mera retórica. O ouro, mesmo sendo extremamente valioso, é tangível, pesado e suscetível. Pode ser confiscado em uma revista policial, apreendido em um terminal aéreo ou simplesmente extraviado durante uma fuga. Já o Bitcoin pode ser armazenado na nuvem, em um dispositivo USB, em um celular ou apenas memorizado. É o único ativo que reúne escassez, mobilidade e resiliência à censura em uma única solução.
Durante a Segunda Guerra Mundial, famílias judias que tentavam escapar da Alemanha precisavam esconder moedas de ouro nas vestimentas ou trocá-las por migalhas para conseguir cruzar fronteiras. Atualmente, em pleno século XXI, qualquer indivíduo em circunstâncias similares poderia utilizar o Bitcoin para resguardar seu capital de modo discreto, seguro e eficiente. Já não se trata apenas de uma tecnologia de nicho, mas sim de uma infraestrutura fundamentada na liberdade.
O argumento de que as criptomoedas podem ser empregadas para atividades ilícitas perde força quando confrontado com a gravidade dos riscos enfrentados por pessoas comuns em áreas de conflito. O sistema financeiro convencional já é amplamente utilizado para lavagem de dinheiro, corrupção e sonegação fiscal. O diferencial do Bitcoin não está na ilegalidade, mas na capacidade de existir à margem do controle excessivo.
Ao final do dia, ativos eletrônicos representam um paradoxo entre liberdade e segurança versus conflitos, porque constituem uma saída efetiva para populações em perigo. Não necessitam de estabilidade para operar. Pelo contrário: foram concebidos precisamente para funcionar quando tudo o mais falha. Quando governos desmoronam, quando bancos fecham, quando fronteiras são bloqueadas, quando a repressão se intensifica, não somente o Bitcoin continua ativo, registrando transações e salvaguardando valores, mas a infraestrutura que permite que esses ativos fluam ou nasçam é o que verdadeiramente agrega valor a uma nova e constante realidade.
Dessa forma, em períodos de paz, é prudente analisar, experimentar e compreender o potencial dos ativos eletrônicos. Contudo, em momentos de conflito, eles podem representar a única ligação entre a devastação e a reconstrução.
Fonte: Money Times